Título com assinatura de Natália Faria, na Pública do último 19. O artigo da jornalista é obrigatório para uma análise ao estado em que nos encontramos em Portugal. Alguns excertos para ler:
“Os emigrantes da década de 60 do século XX demonstraram a mesma coragem e a mesma ousadia que os exploradores dos Descobrimentos”, Rui Ramos.
“Milhares e milhares de portugueses demonstraram nessa altura um enormíssimo espírito de aventura. Saíram da aldeia que conheciam para arriscar viagens de semanas no mar, ou, ainda mais arriscado, para atravessar fronteiras a salto e na clandestinidade, muitas vezes para viver em condições precárias em países de que desconheciam a língua”, Rui Ramos.
“Os portugueses demonstraram nessa década de 60 um pioneirismo na alteração das suas condições de vida que poucos europeus conseguiram demonstrar à mesma escala. Isto aceitando como pioneirismo uma geração inteira de imigrantes que rompem fisicamente com os seus espaços, a sua aldeia, o seu subúrbio de cidade, a sua classe social de origem e o destino social a que estavam predestinados”, Manuel Loff.
É tremendamente injusto a nação não prestar a vénia devida aos emigrantes portugueses que povoam os quatro cantos do Mundo.
Mais. Esquecendo o justo ou o injusto fica a irreparável sangria de talento, de efeitos muito mais nefastos e duradouros. Nos fluxos migratórios perdem-se os novos, os aventureiros, os pioneiros, os que poderiam revolucionar a mentalidade. Sobram-nos as elites, os resignados e os párias. É-me pessoalmente confortável falar das universidades que formam as elites. Formei-me numa – Universidade Católica de Lisboa - e sou, destas instituições, crítico por prepararem pessoas em série para tomarem os bons lugares da economia. Os meus colegas que não me levem a mal, mas quem está na zona de conforto, quem se prepara para continuar na zona de conforto nunca fará a revolução.
Urge a Portugal – e Portugal somos nós sociedade civil, não é o Estado (por cá, por exemplo, o Estado assegura sozinho o investimento em 80% da investigação, enquanto nos Estados Unidos a percentagem ronda os 30) – criar condições para seduzir os portugueses de fora, instigando a uma nova vaga de retornados. Desta vez, acolhendo-os como os outros, os de 1975, mereciam ter sido, em honras e condições que nunca tiveram, olhados de soslaio pela sociedade do continente, com uma mão à frente e outra atrás. Os retornados que das cinzas integraram-se de novo na sociedade sufocante criada por décadas de ditadura e refizeram com sucesso as suas vidas, na maioria dos casos.
Outro assunto em que sinto especial desprendimento porque não tenho nenhuma situação próxima de familiares que estiveram nessa situação. Se eu tivesse mais do que dois heróis – o meu avô e a minha avó – seriam eles. Merecem-me a maior das admirações.
terça-feira, 21 de julho de 2009
Ainda há heróis
Publicada por Anónimo à(s) 08:23:00
Etiquetas: do fundo da comunicação, joao duarte, manuel loff, retornados, rui ramos, youngnetwork
4 comentários:
Caro João,
Excelente post. Sobretudo numa altura em que sinto que, por razões diversas, existe um novo movimento migratório de portugueses que sentem que o seu país não tem para lhes oferecer aquilo que a sua justificada ambição lhes dita. É pena que em Portugal o emigrante seja ainda visto como um "parolo", que vem no verão ouvir o Tony e comer sardinhas. Mas a verdade é que esses mesmos portugueses são, reconhecidamente,excelentes trabalhadores nos países para onde rumaram, com uma capacidade de adaptação acima da média. São realmente uns heróis, uma mais-valia para o nosso país.
Abraço.
Caro Luís,
obrigado. às vezes sai melhor do que noutras.
abr.
jd
Não foi uma nem duas vezes que já ouvi dizer "hum, esses retornados não me inspiram confiança nenhuma...". Sem nunca ter aprofundado o porquê dessa afirmação agora faz todo o sentido. Vindo de pessoas que claramente se encontram na zona de conforto é mesmo de esperar que se sintam receosos de os ver passar à frente num abrir e fechar de olhos...
Parabéns pelo post!
Bom seria ainda que olhásemos os imigrantes com o mesmo respeito e admiração com que deviamos olhar os emigrantes.
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